A política externa de Netanyahu e a guerra em Gaza: a dicotomia nas falas e ações do Primeiro Ministro Israelense

Larissa Cristina Silva Ribeiro
Maria Eduarda Soares de Brito

Resumo

No marco de 113 dias desde do ataque do Hamas em 7 de outubro e o início das investidas em Gaza, a reação do Primeiro Ministro Israelense sobre o discurso do Presidente Luis Inácio “Lula” da Silva demonstra uma estratégia diplomática que não condiz com seus atos na Faixa de Gaza. Nesse sentido, o presente artigo busca analisar essas ações e entender as controversas de Benjamin Netanyahu frente às investidas sobre o povo palestino.

A Guerra de Israel em Gaza e as repercussões ao redor do globo

Em vista aos desdobramentos recentes no conflito Israel-Palestina, a reação do Primeiro Ministro Benjamin Netanyahuapós as falas do líder brasileiro evidenciaram sua estratégia para conseguir apoio no ambiente internacional. Desde o início de seu governo, o israelense sempre teve uma predisposição conservadora, alinhando seus interesses à grandes atores de direita e extrema-direita ao redor do globo, tendo como principal aliado os Estados Unidos. Essa predisposição, combinada à modelagem que o líder fez no governo e no país no decurso de seu longo governo é o que gera tanto apoio ao Primeiro Ministro – apoio esse que vêm tanto da população quanto de aliados externos.

Guerra de Israel em Gaza teve seu início no século XX, seguindo a criação do Estado de Israel em 1948, no pós Segunda Guerra Mundial. Na verdade, olhando a linha do tempo histórica do conflito, o crescimento do movimento sionista começou no início do século, ganhando força com o tempo. Ainda em 1948, mais de 750 mil palestinos foram deslocados de suas casas, no movimento que ficou conhecido como Nakba. Muitos outros movimentos de expansão israelense aconteceram nas últimas sete décadas, o que, no final, trouxe à situação atual. O bloqueio em Gaza, que segue até hoje, teve início em 2007, após o Grupo Hamas chegar ao poder na Palestina. Em 2023, após o ataque surpresa do grupo na fronteira com Israel, o governo anunciou um bloqueio total que cortou as entradas de água, comida e eletricidade, seguido por ondas intensificadas de bombardeio – que já aconteciam desde o primeiro cerco – e que segue sendo criticado por diversos atores nacionais e transnacionais. 

Uma das maiores críticas recebidas de líderes mundiais foram as falas de Luis Inácio da Silva, presidente do Brasil, conhecido como “Lula”. O líder brasileiro, durante uma entrevista coletiva na Etiópia, foi questionado sobre o conflito, declarando que era favorável à criação de um Estado Palestino livre e soberano, e afirmando “O que o governo de Israel está fazendo contra o povo palestino não é guerra, é genocídio”. As declarações receberam apoio de diversos países do Sul Global, colocando o Brasil como um dos líderes do movimento opositor ao massacre em Gaza, o que enfureceu Netanyahu. 

Após o ocorrido, o Primeiro-ministro israelense, Netanyahu, se prontificou e expressou sua revolta sobre a acusação do líder brasileiro, afirmando que a ação do presidente sul-americano foi “antissemita”¹, reiterando que suas falas foram “um desrespeito à memória de 6 milhões de judeus mortos pelos nazistas”. 

As ações israelenses na Faixa de Gaza

Desde o recrudescimento da relação entre Israel e Gaza em outubro de 2023, quando o grupo Hamas realizou um ataque surpresa no território israelense, o primeiro-ministro Netanyahu respondeu de forma ofensiva, segundo o mesmo o conflito era baseado na defesa de seu povo e na destruição do grupo Hamas. Conseguinte a isso, apenas nas semanas que sucederam as atitudes do Hamas, os ataques aéreos e terrestres promovidos por Israel destruíram bairros, deslocaram mais de um milhão de residentes de Gaza, mataram mais de dez mil pessoas e diversas ficaram feridas. Ademais, impôs o que foi nomeado como “cerco completo” em Gaza, proibindo a entrada de alimentos, água e itens vitais essenciais. 

Ao passo que o conflito se desenvolvia, Benjamin não mediu esforços para, segundo o mesmo, defender seu território, de tal modo que a ofensiva na região se tornou tão densa que ampliou drasticamente o número de refugiadospalestinos. Estima-se que, ao longo dos meses de conflito, cerca 6 milhões de civis tenham buscado abrigo em outros países, com o objetivo de não somente fugir da guerra, como também encontrar alimento e abrigo. 

Em 2024, as cenas de crise humanitária se agravaram ainda mais na região,  o Ministério da Saúde de Gaza afirma que os habitantes não têm direito a moradia segura, utilizando da madeira e saco plástico que encontram nas ruas para fazer barracas. Se mudam constantemente de lugar e, de forma óbvia, não possuem condições sanitárias dignas, o que o ministério alerta como perigo para possíveis epidemias locais.

Porém, o conflito não se mantém pela economia israelense, que decaiu cerca de 20% desde de outubro de 2023. O aliado mais promissor e que está financiando os frequentes ataques são os Estados Unidos. O país norte-americano financia Israel desde o início do conflito, enviando dinheiro para ampliar o poderio militar e suas tecnologias, sendo assim, em fevereiro de 2024, um projeto de lei foi aprovado no senado americano disponibilizando aproximadamente 14 bilhões de dólares, com intuito de amparar o outro Estado enquanto o conflito perdure.

Ademais, ao analisar-se as atitudes israelenses sobre os civis, é passível de compreensão que, o que  está acontecendo se configura como uma limpeza étnica² contra a população palestina. Tal modo que, ao atacar ambientes públicos, como escolas, hospitais, atacar pontos de saída dos refugiados, proibir a entrada de ajuda e, destruir aquelas que já encontram em Gaza, e neste artigo não analisaremos a questão dos crimes de guerras conceituados pela Organização das Nações Unidas, Israel está numa incansável busca por dizimar os palestinos. 

Atualmente, a Força de Defesa de Israel continua atacando fortemente a Faixa de Gaza, apesar do inimigo inicial, o grupo Hamas, não tentar mais nenhuma ação ofensiva desde janeiro de 2024, na qual foi interceptada antes de ser consumada. Deste modo, cria-se uma dúvida sobre as verdadeiras intenções do Estado de Israel no conflito contra o território de Gaza.

Controvérsias na política de Netanyahu

As respostas às últimas ações do Primeiro Ministro Israelense, em ambas sua política interna e externa, são ainda muito negativas, o que não parece agradar o líder. Desse modo, ao realizar declarações como acusar Luis Inácio da Silva de antissemita, Netanyahu tenta aumentar sua popularidade no país onde governa, estratégia que pode ser entendida como uma “cortina de fumaça”, que falha em seu funcionamento. Além da queda de sua estima, a economia nacional está regredindo cada vez mais devido aos ataques que ainda persistem. Na mesma proporção, parte deste povo compreende e se revolta contra Netanyahu, indo às ruas e protestando pelo fim dos ataques no território. Para Benjamin, a legitimidade de sua guerra está na defesa de seu território contra ataques terroristas. Porém como apresentado nas seções anteriores, o conflito não se assemelha a uma disputa entre Hamas e Israel, mas sim contra os habitantes da Faixa de Gaza. A estratégia ofensiva não está completamente direcionada a locais onde poderiam se situar o grupo Hamas, mas sim, em locais de circulação pública e áreas residenciais.

Visto que Netanyahu se refere às falas do líder brasileiro como sendo desrespeitoso contra seu povo e toda a história dos judeus, cabe, porém, analisar suas atitudes no que concerne ao conceito de genocidio, ou seja, crimes que tem como objetivo a eliminação física de grupos nacionais, étnicos, raciais ou religiosos. Em primeiro plano, sua primeira ação após o ataque de outubro de 2023 já desencadeou crise humanitária, a criação do cerco completo que proíbe que itens básicos e essenciais chegassem em Gaza, ocasionou inopia generalizada e a morte de crianças que estavam em situação de extrema desnutrição.

Ademais, os locais escolhidos para os ataques são, no mínimo, peculiares para um conflito “legítimo”. Em novembrode 2023,  a ofensiva já era direcionada para hospitais, escolas, mesquitas, ou seja, locais de circulação pública e onde diversos civis foram vítimas fatais. Neste mesmo ano, já contabilizavam mais de vinte mil palestinos mortos e mais de dois milhões deslocados. 

Outrossim, Israel pôs um bloqueio sobre as instituições que tentavam auxiliar a crise humanitária em Gaza, dentre eles, a Organização das Nações Unidas (ONU), que tenta acordos com Netanyahu desde o início do conflito e alega que restringir ajuda humanitária vai contra os princípios do direito humanitário internacional. Conseguinte a isso, também houve a restrição para saída dos civis nos locais onde o conflito estava mais grave, como a situação de palestinos que possuem dupla nacionalidade e estavam tentando ir para seus respectivos países, o mesmo aconteceu com brasileiros em Gaza, que após semanas negociando a retirada e, com diversas datas relocadas e adiadas, conseguiram enfim adentrar no Egito. 

Desse modo, desde o início do conflito até março de 2024, mais de trinta mil palestinos faleceram nos ataques ou nas consequências do mesmo, por falta de alimento e condições dignas de vida, dentre este número de civis, cerca de treze mil são crianças. Portanto, ao analisarmos a frequente aniquilação do povo palestino, é cabível assegurar que, o que esta acontecendo em Gaza, configura atos genocidas e que, apesar das criticas feitas por Nethanyahu sobre as falas do líder brasileiro, suas atitudes vão contra seu próprio discurso.

Notas de fim

¹ De acordo com a International Holocaust Remembrance Alliance, IHRA, um dos exemplos de antissemistmo é “Fazer alegações enganosas, desumanizadoras, demonizadoras ou estereotipadas sobre os judeus como tal ou sobre o poder dos judeus como um coletivo”, entre outros..

² Pode ser classificada como a remoção, eliminação ou a migração forçada de determinados grupos étnicos em uma determinada região.

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